domingo, 19 de junho de 2011

Proposta da Performance Microquímicas do Poder para ENECULT por Cátia Assunção.


Performance 
Microquímicas do poder  
Cátia Assunção [1]

            A presente performance “Microquímicas do poder” tem como participante a  Intérprete Criadora Cátia Assunção. A idéia geral da proposta deu-se pelo interesse da Intérprete Criadora em fazer a transposição entre Dança Contemporânea e Filosofia Social. Assim, foram investigadas, as relações entre estados pré e menstruais (alta tensão muscular) e comportamentos artísticos e estéticos, conteúdos e achados do produto coreográfico.
 Este processo foi favorecido por estudos do filósofo francês Michel Foucault, no livro “Microfísicas do poder” e em outros textos. A Performance “Microquímicas do poder” foi desenvolvida a partir dos resultados práticos e teóricos como bolsista da Iniciação científica PIBIC /CNPq: Os estrogênios no Corpo que cria/ação: Estados de Tensão no corpo que dança. O estudo investigou, a partir de aportes teóricos (em áreas de interfaces entre Dança e Fisiologia, Medicina e Neurociências), os estrogênios e seus efeitos e influências no corpo que dança. Segundo pesquisas, os estrogênios, juntos com numerosos outros fluxos hormonais, influenciam na cognição e no comportamento da mulher.
A escolha do livro “Microfísicas do poder” deu-se pelo motivo de ser uma coletânea de artigos, cursos, entrevistas, debates em que o autor analisa questões entre as correlações entre a medicina, a psiquiatria, a geografia, o corpo a sexualidade, o papel dos intelectuais e a política. Segundo estudiosos, Foucault concebe, em seus últimos textos, o papel dos indivíduos livres, éticos e racionais nas lutas pela transformação social e política. Partindo das citações foucaultianas sobre autonomia, comecei a investigar minhas memórias e vivências como mulher. Comecei minha composição coreográfica sobre diferentes estados do corpo pré e menstrual, ilustrando toda uma trajetória de punições corporais (a exemplo, uma forte contração nos meus ombros, fechado para frente, devido possivelmente pelo fator emocional). Eram padrões de tensões e contrações. musculares crônicas, e suas conseqüências comportamentais (psicológicas e sociais), pesquisando seletivas transformações dessas tensões que resultavam em novos estados, sentimentos e capacidades para ação, o que deu foco, direção e identidade a esse plano de trabalho.
          O plano de trabalho foi desenvolvido paralelamente com o projeto do professor-orientador da Escola de Dança David John Iannitelli  sobre Como e por que a dança nos move, do ponto de vista de alterações bioquímicas corporais, precedente à ação e ao pensamento de dançar. O professor-orientador também não encontrou nenhum registro bibliográfico científico sobre a interface hormônios/dança, além dos atestados descritivos de dançarinos e outros profissionais da dança sobre o ato de dançar e efeitos no corpo e tipos de padrões que resultam em ações endocrinológicas. Estudos encontrados dos movimentos corporais do tango, da dança árabe e da dança hindu citavam interação e inter-regulação entre o espírito da dança, as ações corporais e as emoções que indicavam um provável diálogo entre emoções e movimento através da mediação endocrinológica. Assim como no projeto do ano passado (sobre a neuro-cognição do corpo dançante), do professor-orientador, que constatou que, até agora, este estado e capacidade do corpo de imprimir qualidades performativas aos seus movimentos, de querer e conseguir dançar, não foi ainda estudado com o apoio de mapeamentos cerebrais, nem hormonais.
            Este estudo preliminar fez um levantamento teórico das ações hormonais nos estados de tensão, principalmente na fase pré-menstrual através de estudo da literatura sobre o ciclo dos estrogênios e seus efeitos no corpo e no comportamento da mulher.  Dentre os resultados obtidos, os seis meses de experimentações laboratoriais desenvolvidos por mim estão registrados em diário de bordo; estudos corporais e criativos foram desenvolvidos em laboratórios de corpo & criações individuais e com adolescentes (grupo de IC Junior sob a orientação do Professor David); três obras coreográficas desenvolvidas a partir da utilização das informações corporais (estados de corpo).

Como meios específicos de divulgação da pesquisa e de seus resultados foram publicado por completo como resultado do 1º Encontro de Pesquisadores em Dança, no prelo; um ensaio monográfico e apresentação de entrevista para a TV UFBA; além de quatro apresentações públicas performáticas e uma apresentação oral como aluna especial do Curso de Mestrado em Dança da UFBa.Apresentada também no Enearte de 2010.O processo metodológico para o desenvolvimento desta pesquisa abrange procedimentos de confrontação entre os referenciais teóricos, a prática enquanto artista e a vivência enquanto mulher.Essa pesquisa é de natureza qualitativa e compreensiva. Para Henry, a pesquisa qualitativa propõe uma interpretação significante da realidade, sem pretender ser absoluta e definitiva, sempre aberta a novas informações.
Num viés da pesquisa qualitativa foi utilizado o diário de bordo, para descrição e anotações de idéias, indicações, experiências e principalmente observações das diferentes sensações advindas das mudanças corporais devido a tensão menstrual, lócus onde estes diferentes estados de corpo reverberavam.No que tange aos aportes teóricos para o processo criativo via experimentação ocorrida nos laboratório de corpo, foram relevantes princípios da Dança Tan, Dança Moderna e Capoeira Angola. Para a criação artística foram desenvolvidos laboratórios semanais de corpo e criação, onde se trabalhava individualmente ou no coletivo com as alunas do IC Junior.
Houve filmagens para registrar momentos que seriam avaliados no decorrer do processo.  Nestes laboratórios de criação para a pesquisa de movimento foram utilizados movimentos a partir de técnicas de dança improvisação, apoiados em movimentos extraídos da Capoeira Angola e Dança Moderna, partindo do conceito de Martha Graham de tensão e relaxamento, e a Dança Tan, sob a ótica de Denise Zenicola. Foram propostos exercícios como movimentos de contração e relaxamento, ampliados como conflitos corporais entre a tensão e o relaxamento, e proporcionando uma sinergia dos sistemas endócrinos e neuralmuscular. Assim foi possibilitado a homeostasia que, segundo Damásio, significa controle do organismo a longo prazo por agentes químicos que influenciam os diferentes Estados de Corpo.Os resultados alcançados na pesquisa teórica e prática sobre os hormônios nos estados de tensão no corpo, investigados pela dançarina-pesquisadora nos períodos pré e menstruais foram:
              
 Na primeira etapa houve uma apresentação oral da pesquisa como forma de avaliação da disciplina Estudos Contemporâneos em Dança, do Mestrado em Dança da UFBa, incluindo a apresentação da performance ‘‘Capital estudo nº1”, coreografia também apresentada no X Painel Performático da Escola de Dança da UFBa, em dezembro de 2007. Os estudos da pesquisa serviram de base para a construção do Ensaio monográfico intitulado Estudos introdutórios das relações entre dança/corpo e economia: Um breve paralelo histórico, onde integrei a pesquisa PIBIC com assuntos estudados no mestrado, que foi apresentada como parte da avaliação da disciplina que cursei no mestrado em 2007.2.A Performance “Microquímicas do Poder” foi apresentada no XIII  Encontro de Estudantes de Arte em 2010.

           Na segunda etapa da pesquisa foram investigados os estados de tensão partindo dos poderes microquímicos dos hormônios no corpo que dança, principalmente nos períodos pré-menstruais, numa analogia ao trabalho de Foucault no livro “Microfísicas do poder”. Nele o autor descreve a rede de poderes moleculares que se expande por toda sociedade, entendendo o poder não apenas como repressor, mas também disciplinador e normatizador. O estudo de Michel Foucault entende o saber como peça de um dispositivo político que produz o poder e é intensificado por ele. As coreografias foram desenvolvidas, a partir de todos os dados coletados no processo, as coreografias “Microquímicas do poder” e  O Capital estudo nº1”, que têm como modelo o conceito de performatividade do fazer-dizer do corpo da pesquisadora Jussara Setenta (2006), relacionando o corpo a partir das tensões entre o sujeito e o social; foi feito também um artigo intitulado “Microquímicas do Poder – um processo criativo”, enfocando estados de tensão no corpo que dança partindo das informações adquiridas teoricamente sobre as ações hormonais no corpo , discutindo acerca de.energias que partem de energias contrárias provocadas pelo vigor e presença do artista na cena.
            Este estado de tensão possibilita o artista a se comunicar com o espectador através dos estados de alerta entre ambos, numa perspectiva de pensar a dança enquanto conceito etimológico - TAN - entendida a partir da definição da pesquisadora Denise Zenicola. Conforme avançamos na escala de complexidade cênica (hipóteses) observamos que as energias corporais e mentais se alimentam de impulsos vitais. Num paralelo, as energias do pensamento se apropriam das fontes nervosas dos impulsos primitivos para adquirir maior presença e vigor, em consonância com o conceito de pulsar e expressar, descrito por Zenicola, e o conceito da comunicação pela Performatividade, da pesquisadora Jussara Setenta, entendida como um fluxo discursivo e mutuamente interativo entre falantes e ouvintes. Certamente o conceito Damasiano de estados de corpo e de homeostasia – uma sinergia entre os sistemas endócrino e neural resultante de tensões musculares. Vale esclarecer que, segundo Damásio (2003), homeostasia significa controle do organismo a longo prazo por agentes químicos que influencia os diferentes Estados de corpo.
 A partir das teorias estudadas foi possível o desenvolvimento de uma segunda monografia que também tem como titulo “Microquímicas do poder” e que será utilizada como Trabalho de Conclusão de Curso de Licenciatura em Dança na UFBA; foi elaborado também um artigo, “Microquímicas do poder: um processo criativo” e as performances “O Capital estudo nº1” e “Microquímicas do poder”, apresentadas no XI Painel Performático da Escola de Dança, em junho de 2008; fui entrevistada pela TV UFBA e pude brevemente falar sobre a pesquisa. No Dia D da Dança, apresentei a performance Corpo, que também resultou de estudos da pesquisa sobre o corpo que dança e seus Estados de Tensão.
A coreografia O Capital Estudo nº1” está exposta no canal catiadana  http://br.youtube.com/catiadana como forma de divulgação das pesquisas científicas desenvolvidas a partir dos resultados práticos e teóricos como bolsista da Iniciação científica PIBIC /CNPq: Os estrogênios no Corpo que cria/ação: Estados de Tensão no corpo que dança.
            Os vocabulários se baseavam em movimentos que fazem parte de memórias cotidianas de minha vida pessoal, desde a infância até a idade adulta, pois observei que o tônus muscular padrão de meu corpo tende a grande tensão muscular, principalmente nos ombros, o que provocava um inclinação da coluna para a frente na altura dos ombros. Ademais, meus pés não têm curvas na sola (pé chato), interferindo no alinhamento das pernas e na postura como um todo. Houve alguma modificação após a prática da Dança – com o tempo houve uma melhora. Com o passar do tempo com a conscientização e otimização dos meus estados de tensão em performance, também percebi que adquiri uma postura mais eficaz.
            No decorrer de meus estudos de dança meus mestres me pediam que eu tentasse relaxar para perceber outras possibilidades de movimento; sempre foi difícil o relaxamento, mas mesmo assim tentava encontrar o diálogo entre os estados de tensão e os estados de relaxamento corporal. Por fim, através da prática da Capoeira Angola, pude melhor relacionar performance cênica e estados de tensão. Esses fatores contribuíram na pesquisa sobre estados de tensão corporais, principalmente relacionados aos estudos da TPM. Pude perceber por meio da pesquisa participante que através das sensações nesta fase pré-menstrual fico mais tensa do que o normal, reverberando nos movimentos tanto cotidianos/funcionais, como nas expressões estéticas de dança. Partindo destas observações surge o vocabulário para a performance “Microquímicas do poder”, onde se busca a ocorrência da comunicação entre o espectador e o artista através da expressão dos Estados de Tensão corporal da dançarina. Essas coreografias tentaram descrever o fazer-dizer do corpo (Setenta, 2006), a partir das tensões entre indivíduo e coletivo.
A contribuição do meu plano de trabalho para o projeto de pesquisa do orientador se estabelece na motivação básica da artista-coreógrafa na investigação sobre corporalidade e Dança Contemporânea em áreas de interface desta arte com outras áreas de conhecimento. Sendo o corpo objeto de estudo, investigação e expressão da dança, desvendar questões acerca do fenômeno da menstruação e seus efeitos, parte da natureza intrínseca do corpo feminino vem colaborar com conhecimentos em Dança, particularmente em estudos sobre corporalidade e comportamento criativo do corpo.
            Ao entender que sintomas comportamentais associados à menstruação decorrem de processos bioquímicos alheios à vontade intencionais, tive uma sensação de conforto e informação para que eu lide melhor e de forma mais eficiente com estes estados “críticos” de comportamento em períodos pré e menstrual. Novas estratégias de criação e de tratamento corporal surgiram favorecendo as produções coreográficas e a prática corporal em dança. Tal informação pode auxiliar métodos e práticas também de arte-educação, orientando procedimentos metodológicos do ensino de dança a partir dos dados levantados neste estudo.
 Através das sensações e vivencias ao longo desta pesquisa, enquanto mulher e artista, este trabalho será fundamental para a realização de futuros projetos, como por exemplo: apresentações em seminários, anteprojeto de mestrado, apresentações artísticas, Trabalho de conclusão de curso (TCC), desenvolvimento de textos acadêmicos, orientação metodológica para aulas de dança contemporânea e para apresentações artísticas para a comunidade artística e não artística.



Referências
Damásio. A. Em busca de Espinosa. São Paulo Ed: Companhia das letras. 2003
 Foucault, M. Microfísicas do Poder. Rio de Janeiro. Ed: Graal. 1979.
 Katz, H. Um, dois, três. A dança é o pensamento do corpo. Belo Horizonte: Ed: Fid. 2000.
Setenta. J.O fazer-dizer do corpo: Dança e Performatividade. Salvador. Ed: Edufba. 2008.













[1]  Licenciada em Dança e Bacharelado em Curso Escola de Dança pela UFBA.
katiadanca@yahoo.com.br

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